No
mundo das letras
Moacir Scliar
Vem à livraria nas horas de maior
movimento, mas isso, já se sabe, é de propósito: facilita-lhe o trabalho.
Rouba livro. Faz isso há muitos anos,
desde a infância, praticamente. Começou roubando um texto escolar de que
precisava para o colégio; foi tão fácil que gostou; e passou a roubar romances
de aventura, livros de ficção-científica, textos sobre arte, política, ciência,
economia. Aperfeiçoou tanto a técnica que chegava a furtar quatro, cinco livros
de uma vez. Roubou livros em todas as cidades por onde passou. Em Londres, uma
vez, quase o pegaram; um incidente que recorda com divertida emoção.
No início, lia os livros que roubava.
Depois, a leitura deixou de lhe interessar. A coisa era roubar por roubar, por
amor à arte; dava os livros de presente ou simplesmente os jogava fora. Mas
cada vez tinha menos tempo para ir às livrarias; os negócios o absorviam
demais. Além disso, não podia, como empresário, correr o risco de um flagrante.
Um problema – que ele resolveu como resolve todos os problemas, com argúcia,
com arrojo, com imaginação.
Zaz! Acabou de surrupiar um. Nada de
espetacular nessa operação. Simplesmente pegou um pequeno livro e o enfiou no
bolso. Olha para os lados; aparentemente ninguém notou nada. Cumprimenta-me e
se vai.
Um minuto depois retorna. Como é que me
sai, pergunta, não sem ansiedade. Perfeito, repondo, e ele sorri, agradecido. O
que me deixa satisfeito: elogiá-lo não é apenas um ato de compaixão, é também
uma medida de prudência. Afinal, ele é o dono da livraria.
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